Segunda-feira, 15 de agosto de 2016, às 11h57


A não construção da hidrelétrica no Tapajós aponta um caminho para o setor elétrico brasileiro, que vai em direção ao futuro e passa muito longe da energia suja das termelétricas.

Do Greenpeace Brasil

Os entusiastas da energia hidrelétrica estão tentando mostrar o cancelamento de São Luiz do Tapajós, no Pará, como algo extremamente prejudicial ao país, que poderá “sujar” nossa matriz, levando ao aumento do uso das termelétricas. Isso não é verdade. Pelo contrário, o cancelamento de São Luiz do Tapajós representa a oportunidade para o Brasil colocar de vez um pé no futuro e investir nas energias renováveis verdadeiramente limpas, como a solar e a eólica.

 

Instalação de placas fotovoltaicas para geração de energia solar, na aldeia Dace Watpu. O povo Munduruku habita a Terra Indígena Sawré Muybu, no coração da Amazônia, há gerações. Mas seu modo de vida está ameaçado pelos planos do governo brasileiro de construir um complexo de barragens na bacia do Rio Tapajós. Os Munduruku exigem a demarcação deste território. Greenpeace activists and Munduruku install solar panels at Dace Watpu village. The Munduruku people have inhabited the Sawré Muybu Indigenous Land, in the heart of the Amazon, for generations. The Brazilian government plans to build a series of dams in the Tapajós River basin, which would severely threaten their way of life. The Munduruku demand the demarcation of their territory, which would ensure protection from such projects. Foto: © Otávio Almeida/Greenpeace

Instalação de placas fotovoltaicas para geração de energia solar, na aldeia Dace Watpu. O povo Munduruku habita a Terra Indígena Sawré Muybu, no coração da Amazônia, há gerações. Mas seu modo de vida está ameaçado pelos planos do governo brasileiro de construir um complexo de barragens na bacia do Rio Tapajós. Os Munduruku exigem a demarcação deste território.
Greenpeace activists and Munduruku install solar panels at Dace Watpu village. The Munduruku people have inhabited the Sawré Muybu Indigenous Land, in the heart of the Amazon, for generations. The Brazilian government plans to build a series of dams in the Tapajós River basin, which would severely threaten their way of life. The Munduruku demand the demarcation of their territory, which would ensure protection from such projects.
Foto: © Otávio Almeida/Greenpeace

 

Energia hidrelétrica que custa o desmatamento da floresta, a morte de milhares de animais que vivem nesses locais, o deslocamento forçado de pessoas que dependem dos rios para sobreviver, roubando seu presente, seu futuro e desrespeitando a Constituição, não pode ser considerada energia limpa.

Nas últimas décadas, devido à abundância de nossos rios, o país optou por gerar eletricidade a partir de usinas hidrelétricas, criando assim um modelo “hidro dependente”. Por volta dos anos 2000, quando a energia das hidrelétricas não foi suficiente e tivemos a crise do “apagão”, apostou-se na construção de um grande número de usinas térmicas. Em 2014 e 2015, por conta da grave seca que comprometeu a geração das hidrelétricas, as térmicas ficaram ligadas o tempo todo, o que encareceu – e muito – a conta de luz do consumidor, sem falar no custo ambiental.

Construir novas hidrelétricas, como São Luiz do Tapajós, ou as outras previstas para a Amazônia, é justamente perpetuar esse antigo modelo, que já se mostrou poluente e caro para o consumidor, e que sempre vai precisar de mais térmicas quando não conseguir atender a demanda. Por conta desse “vício” nas hidrelétricas, que custa a destruição das nossas florestas e dos povos que vivem nelas, outras fontes de geração foram desconsideradas por muito tempo e mesmo hoje são pouco aproveitadas. Para piorar, atualmente, dados revelam que os efeitos das mudanças climáticas nas próximas décadas podem levar a reduções nas vazões dos rios amazônicos da ordem de 20% a 30%, indicando que são grandes as chances dessas usinas não conseguirem entregar a energia prometida.

Enquanto isso, o mundo caminha em outra direção. Em 2015, a China alcançou dois novos recordes mundiais de energia limpa, instalando 30,8 gigawatts (GW) em usinas eólicas e 15,2 GW em usinas solares. Estados Unidos e Alemanha também não ficam muito atrás. Aqui no Brasil, o preço médio da fonte eólica já caiu cerca de 40% entre 2009 e 2012 e hoje ela já é uma das mais baratas. Não há mais justificativas para continuarmos protelando o uso dessas fontes.

Dizer que sem São Luiz do Tapajós precisaremos usar as termelétricas por mais tempo é o equivalente a dizer que o planejamento energético do país está paralisado. Ora, se um projeto foi cancelado, é necessário contratar alternativas que já existem e são verdadeiramente limpas para substituí-lo, e não usar as térmicas, que foram concebidas apenas para situações de emergência. Sabemos que não falta sol e nem vento no país, então por que não contamos com essas fontes para suprir nossa demanda?

Hoje é possível fazer a substituição do projeto de São Luiz do Tapajós com uma combinação de usinas eólicas, fotovoltaicas e a biomassa, que poderiam fornecer toda a energia que era prevista para São Luiz do Tapajós no mesmo período de tempo e com patamar similar de investimentos. Para isso basta aumentar em 50% o nível médio de contratação atual dessas fontes.

Além de possível, apostar nessas novas fontes é ainda mais vantajoso e torna o sistema mais seguro, pois usinas eólicas, fotovoltaicas e a biomassa podem trazer energia firme para o sistema e ainda são descentralizadas, ou seja, produzem energia em muitos lugares e mais perto dos centros de consumo, diminuindo o alto custo com novas linhas de transmissão. Como resultado, teríamos um suprimento diverso, deixando de depender apenas de hidrelétricas ou de combustíveis fósseis. Mas, claro, é preciso vontade política para investir nessas fontes, em vez de continuar olhando para o passado. O cancelamento de Tapajós nos deu a oportunidade de darmos um passo à frente no setor energético, impulsionando o uso de novas e modernas fontes de energia, e não um passo atrás, como propõe o discurso falso e ultrapassado das térmicas. Chegou o momento de mudar de vez essa história.

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