Atualizado em 13 de julho de 2021


Por João Sérgio Barros

Matéria publicada originalmente no site Virtude - Birdwatching e Natureza


Tudo começou quando recebi uma mensagem do Octávio Salles dizendo que havia um ninho ativo do gavião-de-penacho em Iporanga-SP. Na ocasião era praticamente impossível ir até o local e parecia que o bicho estava incubando ainda, o que me fez postergar a realização do antigo sonho de encontrar o lendário Apacanim para as férias, em janeiro, quando, se tudo corresse bem, o filhote já estaria crescido, favorecendo melhores registros, que eternizariam aquele tão aguardado momento.

 

Gavião-de-penacho, voo espetacular. Foto: © João Sérgio Barros

 

Estava de férias no Rio, terra de minha esposa, então dali partimos, eu e o grande amigo Gabriel Mello, que, maníaco como eu, topou um insano bate e volta que propus.

Mas no longo caminho que trilharíamos, havia uma grande possibilidade. Vale o parênteses:

Uma semana antes de nossa partida, estava passarinhando em Ubatuba quando conheci o Fábio Souza, guia local, gente finíssima, que estava levando um amigo, o Constantino Melo, gente da melhor qualidade também, a um local onde os raríssimos apuins-de-costas-pretas estavam se alimentando. Infelizmente, para tristeza de todos, eles não apareceram. Mas comentei com o Gabriel que conhecia o tal local e que este ficava próximo à estrada, então marcamos nossa saída para as 4h da manhã com o intuito de chegarmos em Ubatuba ainda num bom horário.

Conforme combinado saímos às 4h e por volta das 9h chegamos ao local. Incrível… eu nem havia percebido a presença deles, o Gabriel quem viu. Apesar de ser um bando de no mínimo 26 indivíduos (contados numa foto do bando em voo), se alimentando em uma árvore de pequeno porte, eu não os percebi, tal o silêncio e o mimetismo perfeito daquelas aves. Ficamos eufóricos, e por um momento o penachudo saiu de nossas cabeças. Ficamos observando e registrando o bando por um bom tempo, até que eles partiram, ainda aguardamos um possível retorno à árvore (pois eles já haviam partido, e pouco tempo depois retornaram), mas os muitos quilômetros que ainda faltavam falaram mais alto, e então resolvemos partir, com a satisfação de observar e registrar uma ave que até seis anos atrás não havia nenhum registro fotográfico.

A viagem transcorreu relativamente tranquila, digo isto porque pegamos um bom trecho sob chuva, o que, numa estrada muito sinuosa e estreita, deixa as coisas mais temerosas, além de nos causar certa aflição: será que o tempo lá estaria ruim?

 

Gavião-de-penacho encarando o Suiriri. Foto: © João Sérgio Barros

 

Antes de acabar a luminosidade do dia ainda demos uma parada providencial para descansarmos e, sedentos por uma passarinhada, tentarmos algum bicho naquelas terras promissoras, afinal estávamos próximos do maior continuum de Mata Atlântica que ainda resta.

Bem, partimos para a reta final de nossa viagem, após a tentativa frustrada de encontrarmos algum lifer (ave que você observa pela primeira vez na vida) naquela rápida parada.

 

Gavião-de-penacho atacando o ninho do Suiriri. Foto: © João Sérgio Barros

 

À medida que nos aproximávamos do nosso destino a estrada ia ficando menor e menos movimentada, até pegarmos uma estrada de terra, já na cidade de Iporanga, rumo ao bairro da Serra, onde se concentrava a maioria das pousadas, porta de uma das entradas do PETAR. A sensação era que estávamos na região mais isolada do desenvolvido Estado de São Paulo.

 

Gavião-de-penacho pouso. Foto: © João Sérgio Barros

 

Já era noite quando encontramos o Júnior Petar, que nos anestesiou de todo o cansaço com seus relatos incríveis das maravilhosas aves que habitam a região. Então pensei, o gavião-de-penacho pode ser um abre-alas para que Iporanga se torne definitivamente um dos grandes destinos para a observação de aves, pois a pujança de aves magníficas e raras e a facilidade de observá-las, conforme nos relatou o Júnior e pudemos comprovar em alguns casos, realmente nos maravilhou. Que lugar você observa o socó-boi-escuro da beira da estrada? E a certeza de encontrar a incrível araponga em um mirante deslumbrante? E o que dizer dos sabiás-cica que frequentam os pomares atrás das mexericas da estação? Sem falar, claro, das condições únicas do famoso ninho (que esperamos prosperar por muitos anos). Bem pessoal, de uma coisa estou certo, tenho que voltar àquele lugar.

 

Gavião-de-penacho. Foto: © João Sérgio Barros

 

Enfim o esperado dia havia chegado, depois de um pequeno contratempo (que não é digno de menção) chegamos, enfim, à famosa fazenda onde fomos muito bem recebidos pela Diana, que nos guiou até o ninho. No caminho um encontro com o encontro (Icterus pyrrhopterus), lifer para mim. Ainda no curto caminho que separa a casa da fazenda do ninho encontramos um curió, que não deu muita chance para fotos, também nesta altura dos acontecimentos a ansiedade era tão grande que nem fizemos questão de insistirmos com o grande cantor e continuamos a caminhada morro acima.

 

Gavião-de-penacho com filhote. Foto: © João Sérgio Barros

 

Quando avistamos a árvore do ninho saquei o binóculo e pude me certificar que a fêmea estava lá! A sensação não consigo descrever, teria que ser um habilidoso poeta, daqueles que sabem colocar a alma no papel. Fácil perceber só a nossa felicidade, estampada em largos sorrisos.

 

Gavião-de-penacho no ninho. Foto: © João Sérgio Barros

 


Publicação original: Terça-feira, 12 de agosto de 2014 às 18h49