1ª reunião do CMTT, slide da apresentação feita pelo secretário municipal de Transportes, Jilmar Tatto.

1ª reunião do CMTT, slide da apresentação comparativo entre São Paulo e outras capitais quanto a área de abrangência do transporte coletivo.

1ª reunião do CMTT, slide da apresentação feita pelo secretário municipal de Transportes, Jilmar Tatto.

Av. Radial Leste, confluência de integrações entre Metrô, ônibus e CPTU: Dificuldade para entrar no coletivo. Veja que a foto confirma o número maior de mulheres, neste caso três vezes maior. Foto: aloimage

Horácio Figueira, Jilmar Tatto, Maurício Bronizi Pereira, que defendeu o Plano de Mobilidade Sustentável e integrado, e Denine Dau. Foto: Divulgação/SMT.

Um desafio gigantesco em se tratando de planejamento urbano, que envolve inúmeros interesses, mas terá como prioridade o coletivo em detrimento do transporte individualizado. Esta é a realidade atual.

 

Gerson Soares

São Paulo, 31 de Março de 2014

 A manhã começa a dar lugar aos primeiros raios solares e um fato incrível está para acontecer. Uma moradora do Tatuapé entrará na Estação Carrão do Metrô, Linha 3 - Vermelha. Seu destino é a Estação Trianon Masp na Av. Paulista, Linha 2  - Verde. Deixando o suspense de lado, o horário de entrada no Carrão foi às 6h27 e a usuária disse à nossa redação que chegou à Trianon às 6h55. Melhor ainda, os vagões estavam praticamente vazios.

Sorte? Milagre? Inexplicável, mas isso acontece mesmo hoje. No Metrô, na Radial Leste, às vezes é fato o trânsito ter um espasmo, assim diria um médico. Um vácuo se forma entre um horário e outro, entre um vagão e outro. Mas esta não é a regra.

É difícil não sentir nostalgia e refletir sobre os erros do passado, quando se pensa na cidade de São Paulo e sua grandeza, só comparada a outras metrópoles mundiais, como Londres, Nova Iorque, Paris ou cidade do México, por exemplo – como veremos num dos gráficos colhidos para esta reportagem junto à Secretária Municipal de Transportes.

Pensemos no Rio Tietê. Como poderia ter sido bem aproveitado para a navegação e transportes coletivos hidroviários, com estações espalhadas pelas suas margens, num belo e imenso jardim. E, assim como os jardins de Santos, no litoral paulista, poderia ocupar um lugar no Guinness book.

Faltou decisão e vontade também, quando os sistemas de abastecimento e esgotos foram pensados. O Rio Tietê volta à tona, mas não foi o único envolvido na falta de planejamento urbano do final do século XIX e início do século XX. Propostas e cérebros para colocá-las em prática não faltaram. O que faltou foi vontade mesmo; o que sobrou: interesses. As enchentes que o rio provocou vingativo, foram um alerta; e a correria para providenciar o abastecimento de água para a grande São Paulo não deixa dúvidas sobre os erros do passado.

Fica claro agora que a falta de mobilidade urbana precisa ser repensada de forma lógica e futurística para não sofrer dos mesmos percalços, nos percursos administrativos gestores da cidade e tapar o sol com a peneira mais uma vez.

Prioritariamente, elegeu-se o automóvel – que chega a ser chamado de transporte individual – como não prioritário, o grande vilão do caos urbano. Portanto, deve-se pensar na mobilidade urbana em São Paulo, como pedestres e usuários de transportes coletivos.

O transporte e entrega de mercadorias e serviços também estará enfrentando mudanças nos próximos anos. Elas já começaram nas tomadas com os shoppings centers da cidade e associações de comércios, no que diz respeito a todo tipo de transporte que não seja o de pessoas. Uma das primeiras mudanças foi a proibição da circulação de caminhões durante o dia, de maneira geral culminando com os transportes noturnos de bens e serviços.

Todas as propostas levadas até agora ao Conselho Municipal de Transporte e Trânsito (CMTT) – cuja criação se deu no dia 1º de julho de 2013, e a primeira reunião aconteceu no dia 2 de agosto do mesmo ano –, acabaram convergindo para um só objetivo que é racionalizar o uso do sistema viário existente. O que leva a várias consequências, como foi explanado pelo secretário municipal de Transportes Jilmar Tatto, durante a terceira reunião do CMTT, quanto a “qualificar o sistema de transporte coletivo, a acessibilidade, o ambiente adequado para modos não motorizados de deslocamentos (pedestres) e aprimorar a logística de transporte de cargas”.

Outro fator é a participação democrática no aprimoramento da mobilidade urbana. São inúmeras as entidades, sindicatos, associações e mais uma gama de pessoas envolvidas, cada qual representando setores interessados nas melhorias que precisam ser pensadas para o futuro da mobilidade em São Paulo. Senadores, políticos, religiosos, sindicalistas, empresários esportistas e outros tantos, opinam e vislumbram os dados apresentados de maneira abrangente pelo CMTT. Esses dados e estudos estão abertos e podem ser acessados livremente.

Dentre as curiosidades que nos chamam atenção, temos um mapa comparativo da malha abrangida pelos transportes coletivos entre São Paulo e outras quatro capitais mundiais – veja nas imagens ao lado. Os ônibus ainda são o meio mais utilizado, respondendo por 8,2 milhões de viagens – o metrô fica com 2,2 milhões e os trens com 1,1 milhão –, segundo informações do secretário municipal de Desenvolvimento Urbano Fernando de Mello Franco. Nos horários de pico, os carros representam 79% com 1,6 passageiros – essa frota aumentou 15% nos últimos quatro anos representando 900 mil veículos.

Curiosamente ainda, entre os anos de 2005 e 2012, observa-se que há mais passageiros transportados do que pagantes, devido aos subsídios de integração ao Metrô, CPTM, entre os próprios ônibus, das gratuidades e dos estudantes. Nesse período, São Paulo elegeu três prefeitos (Marta, Kassab e Haddad) e a tarifa subiu de R$ 2 para R$ 3 reais. Apesar do aumento da tarifa e de passageiros, a arrecadação caiu, devido ao equivalente entre pagantes reais e subsidiados, ou seja, mais pessoas são transportadas e menos pagam. Também está demonstrado que as mulheres são maioria no uso do sistema de transporte coletivo.

Durante os debates nas seis reuniões do CMTT, existe o momento de palavra livre proposto por Jilmar Tatto desde a primeira reunião, quando foram eleitos os componentes dos devidos cargos inerentes ao Conselho. Donay Jacinto Netto (suplente) do Sindicato dos Transportadores Autônomos de Escolares e das Microempresas (SIMETESP), sugeriu a inclusão do transporte escolar nos projetos de transporte coletivo da cidade, alegando que este atende desde o berçário à universidade. As representações da FACESP/CONAM/SETCESP, demonstraram interesse pelos empregos próximos às moradias, discutindo o desenvolvimento econômico dos bairros. Esta última levaria a um estudo interessante sobre os milhares de veículos que deixam a zona Leste em direção ao Centro diariamente. Mas são várias outras propostas.

A questão do transporte aos estudantes vem sendo apontada em todas as reuniões do CMTT. A razão pode ser facilmente percebida e lembrada durante os períodos de férias dos estudos escolares e universitários. Essa questão leva a outra. Seria uma boa ideia pensar em transportes coletivos de maneira mais ampla, não só no que diz respeito aos alunos do berçário, fundamental e médio, mas também dos universitários, proporcionando aos jovens um transporte personalizado numa parceria público-privada.

Outra proposta é a comunicação com os usuários do sistema de transportes coletivos, com destaque para a supressão e mudanças de linhas, atrapalhando muito a vida das pessoas afetadas por essas medidas, o que contraria os princípios de criação do próprio CMTT, como no caso da zona Leste. Ainda sobre essa área da cidade, foi alçada a questão dos cadeirantes e suas dificuldades quanto à mobilidade urbana.

Mais um dado importante é que o paulistano gasta em média 2h10 por dia em locomoção. A isso tomou-se como outro vilão, depois de tanto tempo. Antes tarde do que nunca.

A maior polêmica das reuniões entre dezembro, janeiro e fevereiro ficou em torno do uso dos corredores de ônibus pelos táxis nos horários de pico, que perderão definitivamente essa prerrogativa no dia 14 de abril, quando começarão as aplicações de multas e pontuações nas carteiras de quem desrespeitar a restrição. Apesar dos apelos, inclusive quanto ao tempo gasto pelos passageiros desse tipo de transporte, relativo ao custo e benefícios para a cidade, por fim a prioridade do CMTT voltada para o coletivo prevaleceu.

A União Estadual dos Estudantes de São Paulo (UEE-SP), também enfatiza essa priorização. Mesmo solidarizando-se com o segmento dos taxistas, a entidade demonstrou sua visão, através da conselheira titular do CMTT Carina Vitral. Saudando a meia passagem, ela disse na 4ª reunião do conselho, que “hoje o estudante tem acesso a esse direito, e de forma firme a defesa do transporte público coletivo de qualidade socialmente reverenciado e com tarifa acessível a toda população. A UEE-SP é sensível à classe dos taxistas, mas o fato é que existe uma opção de política pública que precisa ser tomada com coragem, a cidade precisa estar convicta pela opção do transporte público, ao se deslocar é necessário entender o que é melhor para a cidade”.

Depois de ter assimilado o novo conceito de entregas noturnas para aliviar o trânsito, o Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Região (SETCESP), através do conselheiro Mauro de Souza, lembrou que “o CMTT deve considerar que a carga também é coletiva”.

O secretário municipal de Transportes Jilmar Tatto, afirmou em janeiro deste ano que o tempo das pessoas nos ônibus diminuiu em 38 minutos por dia devido aos 300 Km de faixas exclusivas implantadas em 2013, e prometeu mais para 2014. “Isso é ganho de qualidade de vida. Estamos terminando uma licitação de novos corredores de ônibus que contemplam todas as melhorias que os corredores necessitam. O uso da faixa exclusiva, quando concebida foi para ser exclusiva de ônibus. O transporte coletivo tem que ser para todos, se a via não ficar liberada não podemos fazer a programação do ônibus para que ele passe nos horários determinados, a pessoa tem que ter a segurança que o ônibus vai passar no horário estipulado. A secretaria de transporte está num esforço danado para melhorar o transporte coletivo de São Paulo, precisa ter uma mudança cultural, precisamos mudar nosso comportamento ou a cidade vai travar”.

As oportunidades estão lançadas, para que os gestores desta magnífica megalópole, a façam sentir-se novamente orgulhosa de ser um exemplo, que inspira até mesmo os mais desafortunados. Planejar é preciso, mas o tempo urge. Dos tempos da velha cidade ainda há muito para resgatar, apesar dos erros do passado. Talvez, a tranquilidade já tenha sido totalmente esquecida, mas ainda é possível ter dignidade, honestidade e planejar o futuro com a mesma elegância que já fez São Paulo ser reconhecido mundialmente pela beleza urbanística.