Sábado, 5 de maio de 2018 às 17h15


Talvez, alguns amigos e outras pessoas não gostem do que virá a seguir. Mas, neste caso, peço que reflitam com o coração aberto para o perdão. Afinal, eu também já tive um.

Gerson Soares

Estava me preparando para sair de casa e da janela de vidro cortinada pude observar um vulto silencioso em frente a minha garagem. Curioso e até apreensivo fui ver do que se tratava. Não era nada grave, apenas uma bela moça com seu animal de estimação. Urinava em minha árvore, observado por ela, bem ao lado dele. Eu a plantei quando era apenas uma muda e agora está crescida, atrai os cães.

 

Imagens: Widiwidi e Tom Fawls (seta). Arte: aloart

 

Ao ver-me, a moça balançou a cabeça, como a indagar-me sobre o motivo de estar lhe encarando. Normal. Continuei no mesmo tom, com nossa comunicação paraverbal, inicialmente. Mexi apenas os olhos e um leve aceno com a cabeça, apontando para o cão. Como ela não compreendeu e o animal continuou aliviando-se resolvo falar:

– O cachorro está...

Ela nem me deixou completar a frase. Acho que deve ter entendido a expressiva comunicação paraverbal antes mesmo de eu ter começado a minha frase, gentilmente interrompida por ela:

– Ele está só mijando.

Disse, sem se abalar, usando o verbo mijar. O que não era exatamente o que eu esperava ouvir.

– Sim, mas isso cheira mal, não é bom.

Retruquei um tanto indignado. Afinal, é a minha árvore aquela que plantei desde pequenina, me senti um pouco chateado de alguma forma, a árvore nem sentiu, não disse nada.

Depois de aguardar que o cachorro terminasse – deduzi ser macho pelo ato de erguer a perna –, ela ainda respondeu:

– Um monte de cachorrinhos mijam por aí, todos os dias. Mas eu não quero confusão, eu limpo depois.

Voltei para o interior da minha casa, antes mesmo que ela se saísse completamente da meu campo de visão. Consciente de algum modo, a moça trazia em uma das mãos um saquinho plástico, provavelmente com fezes do “cachorrinho”. Ainda bem que essa parte não foi feita na minha árvore, ou será que foi?

De qualquer modo, o mau cheiro das inúmeras “mijadas” diárias não é nada agradável, muito menos das fezes na vizinhança, nos canteiros das árvores que ficam em frente à minha residência. Alguns vizinhos já colocam avisos nada educados dirigidos aos donos de “cachorrinhos” que andam por aí trazendo seus amigos para aliviarem-se ambos nas casas dos outros. Afinal, as necessidades fisiológicas (para não usar aqueles outros verbos) sejam de animais ou de pessoas, são coisas particulares e que cada um cuide das suas.

Estou esperando a bela moça até agora para cumprir sua promessa de desinfetar a “mijada”! Acho que não cumprirá. E entendo que é difícil controlar o xixi dos animais. Por isso não discuti, mas acho que este é um problema a ser melhor repensado pela sociedade.

No dia 4 de junho de 2015, o Veja.com divulgou pesquisa do IBGE, sob o título “A casa agora é dos cães – e não das crianças”, onde o instituto revela que o número de famílias que criam cachorros já é maior do que o de famílias que têm crianças. Naquela data, havia 52 milhões de cães contra 45 milhões de crianças de até 14 anos, apontava o levantamento feito no Brasil. De cada 100 famílias no país, 44 criam cachorros, enquanto só 36 têm crianças, reportaram Cecilia Ritto e Bianca Alvarenga do Veja.com.

Até aí tudo bem, os cães fascinam a humanidade acompanhando sua trajetória através dos tempos. A diferença é que as crianças costumam “fazer” nas fraldas (quando pequenas) e depois já são orientadas ao uso do banheiro. Enquanto os “cachorrinhos”, que de acordo com a pesquisa tendem a aumentar, preferem levar os seus donos para “fazerem” na rua, utilizando as calçadas como sanitários e os vizinhos como seus empregados, que devem lavá-las e asseá-las com desinfetantes, etc., para não compartilharem o mau cheiro.

Ah! Para quem ainda quiser continuar lendo, se é que chegou até aqui, falo do meu cachorrão.

O meu, não era um “cachorrinho”, era um cachorrão, um animal da raça Fila Brasileiro e fazia suas necessidades em casa, na área dele, lógico. Eu não me importava de limpar. Até que era muito disciplinado, o ensinei a fazê-las somente num dos ralos que havia no corredor e de tão inteligente aprendeu e seguia o que aprendera rapidamente. Confesso que nas poucas vezes que saímos, ele deve ter feito xixi em algum poste, era um filhotão e nem entendia muito bem essa história de demarcação de território. Eu também não permitia que ficasse exercitando seu faro por toda parte, com medo que pegasse alguma doença. Vê-lo doente não estava nos meus planos. Seu objetivo era vislumbrar aquele mundo estranho que havia fora do quintal e com isso se divertia. Pelo xixi dele eu peço desculpas.

Aos 20 e poucos meses de vida, depois de criá-lo com muito carinho desde os 40 dias, o deixei ir para o sítio de um colega de trabalho que se aposentava, acabara de montar um ranário (criação de rãs para comércio e consumo). Contei a ele que ficava triste em ver aquele cachorrão num lugar tão pequeno e olha que a minha casa era espaçosa, mas só um quintal ele tinha para brincar e correr. O freio das patas às vezes falhava e batia nas paredes. Lá no sítio o meu amigão encontrou a natureza, outros de sua espécie e fez amizades. Viveu anos felizes, tenho certeza. O deixei partir com a dor de quem perde um grande amigo, até hoje sinto. Fiz isso por amor, deixando que partisse daquele pequeno quintal para uma vida esplêndida de amplos espaços e liberdade. Da minha família ele sempre fará parte.

Limpeza, varrição e boa vizinhança

Para quem conseguiu chegar até este ponto... Muito grato! Sobre os serviços públicos, diga-se de passagem... Bom é melhor pular uma grande parte deles, mas para quem não tiver conhecimento, o contrato de limpeza da Prefeitura da Cidade de São Paulo com as concessionárias encarregadas da varrição, não incluem as calçadas das residências e condomínios que devem ser limpas pelos responsáveis. Quanto aos saquinhos plásticos deixados pendurados em árvores, nos canteiros e até espalhados pelas ruas, repletos de fezes pelos donos de “cachorrinhos” – quando encontram o asfalto e os carros que os atropelam [os saquinhos de plástico, claro!] é possível imaginar o que acontece –, nem sempre ou quase sempre, não são recolhidos pela Prefeitura e seus servidores. Quem faz o serviço de limpeza, portanto, são os vizinhos. O que convenhamos não é justo.

Maioria dos municípios do país teve, nos últimos anos, pelo menos um registro de imigrante internacional, aponta Atlas Temático – Observatório das Migrações em São Paulo, apoiado pela FAPESP. Fotos da exposição "Somos todos Imigrantes" - Missão Paz / Chico Max

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