Sábado, 26 de maio de 2018 às 21h27


Ele não aguenta mais tanta corrupção e administrações ridículas, daquilo que tanto lhe custa ganhar, o suado pagamento pelo trabalho diário. Esses salários, remunerações por serviços prestados ou as contrapartidas pelo bom serviço em grande parte, de uma forma ou de outra, é entregue ao Governo através dos impostos. Mas, ao invés de aproveitá-los com inteligência e bom emprego o utilizam para viverem em outra dimensão, um mundo muito diferente daquele em que vivem os contribuintes.

Gerson Soares

A rede social WhatsApp sem dúvida traz muitas bobagens, diversão, piadas, vídeos pornográficos, fake news e todo tipo de notícias, inclusive as boas e verdadeiras. Com a greve dos caminhoneiros que neste sábado atinge seu 6º dia, tem o apoio de parte da população brasileira e adesão de outras categorias, e até já se vislumbrou nela a volta dos fatos que ocorreram em junho de 2013, quando o aumento das tarifas de ônibus originaram as maiores manifestações populares – sem a ingerência de partidos políticos, sindicatos e outras facções – de que se tem notícia no Brasil.

 

O povo brasileiro só quer mudar o Brasil. Ilustração: aloart

 

Os caminhoneiros estão se manifestando de forma pacífica, mas há quem veja truculência e ela dificilmente não foi aplicada de alguma forma. No entanto, não há registros de violência mais grave por parte dos manifestantes que pararam o Brasil em menos de uma semana. A Abcam que segundo sua própria avaliação “representa os interesses de, aproximadamente, 500 mil caminhoneiros autônomos em todo o país; sendo que, deste total, 200 mil caminhoneiros somente no Estado de São Paulo”, divulgou uma nota nesta sexta-feira (25), logo após a fala do presidente Michel Temer, feita em rede nacional, anunciando que usaria as Forças Armadas para dispersar os caminhoneiros e liberar as estradas. Em seu comunicado a entidade pedia que os motoristas dos caminhões se recolhessem e liberassem as rodovias para evitarem confrontos e prováveis desgastes com os militares. Apesar de ter sido taxada de radical pela maioria quando não aceitou a proposta governamental – o presidente da Abcam deixou a mesa de reunião promovida em Brasília por não concordar com os termos do governo –, a entidade demonstrou sua liderança quando pediu uma trégua e foi atendida. O presidente Michel Temer recebeu um ofício, protocolado pela entidade no dia 14 de maio junto à Coordenação-Geral de Documentação (CODOC)/Presidência da República, no qual estão explícitos os motivos de que caso não houvesse uma contrapartida governamental “uma paralisação geral seria inevitável” (leia o documento na íntegra). O governo não agiu e a partir do dia 21, deu no que deu.

Por vezes, não lutar é mais contundente do que perder uma batalha. Ensinou Sun Tsu, em seu livro “A Arte da Guerra”, escrito no século IV a.C. Assim, esta lição está sendo dada pacificamente e o governo a compreendeu. Viu que não é preciso quebra-quebra, armas, bombas e força bruta para literalmente parar o Brasil. Afinal, por culpa das péssimas administrações que se sucederam ao longo das décadas – e não somente nos governos de Lula, Dilma, Temer ou ainda Fernando Henrique, Itamar Franco e outros, inclusive durante os governos militares –, o país sempre priorizou os interesses de poucos em detrimento daquilo que realmente interessasse à Nação Brasileira, que é formada pelo seu povo e não por alguns líderes de segunda categoria, que ao longo do tempo pouquíssimo ou nada fizeram em matéria de investimentos que garantissem neste século XXI, uma vida mais tranquila para o povo como um todo. Isso não teria sido tão difícil, temos exemplos palpáveis como o do Chile e da Coreia do Sul que em pouquíssimo tempo modificaram o perfil de sua população, para melhor.

Ao longo de décadas, todos que estiveram à frente dos governos se beneficiaram de leis que os perpetuam no poder, de regras que são seguidas tacitamente para sustentá-los, como os famigerados impostos mal aproveitados. Injustos, por não retornarem como deveriam aos bolsos de quem os gera, ou seja, a população brasileira que transpira no dia-a-dia para sustentar suas famílias, pagar a escola dos filhos e um plano de saúde – a ANS (Agência Nacional de Saúde) agora está criando regras que só irão beneficiar as operadoras, com uma franquia comparada ao seguro de carros que segundo as entidades de proteção ao consumidor e ligadas à medicina, promoverá a regressão do parco avanço conseguido no que tange à prevenção de doenças. Estou falando de quem ainda pode pagar escola particular e plano de saúde para a família. A grande maioria da população depende mesmo do governo que lhe suga e avilta.

O povo brasileiro demonstra todo momento, a cada segundo, que quer mudar o Brasil.

Ele não aguenta mais esperar por julgamentos que levam um tempo interminável, recursos que adiam sem solução nos tribunais os casos de corrupção e usurpação do tesouro público. O povão não aguenta mais, palavras e retóricas infindáveis, notícias que se arrastam há décadas sobre o que se faz em desacordo com a vontade popular. E qual seria essa vontade? Ter uma vida melhor, sem tantos sobressaltos, nada tão difícil de satisfazer a um povo de origens simples que ao longo do tempo, apesar de um início colonial conturbado, recebeu uma injeção de ânimo e conhecimentos com a chegada dos imigrantes europeus e a força de trabalho na qual também contribuíram os negros – estes que sofreram como ninguém as agruras da ambição numa época que deve ser guardada como uma grande lição para a humanidade. O povo quer poder simplesmente sair às ruas e caminhar junto à praia, sentar no banco da praça, conversar com os amigos num bar ou refestelar-se numa varanda, sem pensar que no minuto seguinte um assaltante levaria sua vida em troca de um mero celular, um par de tênis, uma mochila da qual nem conhece o conteúdo, uma bolsa de mulher. A instabilidade social gerada pelo abandono e irresponsabilidade das instituições governamentais, através dos anos sem fim, geraram uma comunidade sem eira nem beira, desgarrados da sociedade, uma população que muitas vezes vive nas periferias abandonados à própria sorte, sem saúde, educação, saneamento básico e principalmente orientação e amparo para progredir. O que uma boa parte dos brasileiros tem conseguido, é com muito esforço, muita garra. Foi aproveitando as mínimas oportunidades que tiveram, não foi com greves ou paralisações.

Mas não é só isso que os brasileiros demonstram querer mudar. Eles querem seus filhos estudando com professores capacitados, onde todos juntos e felizes formem uma rede de conhecimentos que os levarão ao futuro cada vez melhor. O brasileiro quer ir a um pronto socorro e ser atendido, a um hospital e realizar seus exames. Isso é pedir muito? Claro que não. Não em um país riquíssimo como este, onde não falta nada. Mas que por outro lado, tudo é horrorosamente taxado, vergonhosamente administrado e escandalosamente roubado.

O povo brasileiro quer mudar o Brasil porque acredita que isso é possível.

As generalizações feitas aqui, sobre alguns poucos pontos que afetam a vida das pessoas colocando em detrimento a falta de ações governamentais que mudem essa situação, é a visão que se tem atualmente a respeito desse batalhão que ocupa cargos nos três poderes que regem a Pátria – nos mais diversos escalões –, prestam juramentos em nome da justiça e da honestidade a cada eleição, passam a se deleitar sobre as regalias várias que lhes cabem em nome da lei, nomeiam seus cupinchas e nem precisam mais se lembrar de quem os colocou lá: o povo. Depois de alcançarem os cargos públicos, alguns nunca mais precisarão se preocupar com nada pelo resto de suas vidas, são remunerações e vantagens vitalícias, que a riqueza nacional lhes proporcionará, e muitas vezes aos seus descendentes, com salários e benesses nem sonhados por quem os mantêm com o suor do trabalho honesto. Isso é justo?

Esse mesmo povo que vai às urnas daqui a apenas cinco meses está dizendo aos próximos governantes: basta de tanta vergonha, basta de tantas perdas, basta de impostos exagerados, basta de tudo o que está errado. O povo quer acertar.

No início, citei o WhatsApp. Com a continuidade desta greve ou locaute – como agora quer o governo –, que prejudica todos os setores e poderá se assemelhar a um estado de guerra, mesmo sem belicismos, a popular rede social chegou a ser acusada por algumas mentes brilhantes, ao afirmarem que “os caminhoneiros não têm representatividade, muitos são autônomos que se comunicam pelo WhatsApp”. Isso foi dito tentando diminuir o valor do movimento, ou denegrir o meio pelo qual os caminhoneiros encontraram para se comunicarem, surpreendendo as autoridades. Pensando assim, nossas mentes mais brilhantes, nada mais fizeram do que autenticar seu distanciamento entre o que a maioria deseja e aquilo que a desgastada casta político-administrativa lhes quer oferecer. Essa mesma casta se colocará à disposição nas próximas eleições e eis aqui uma pequena, mas ainda uma oportunidade para mudanças.

Prender empresários não mudará o Brasil

Todos querem mudanças, o povo brasileiro reclama da sua situação deplorável, isso foi sentido nestas quinta e sexta-feira, quando ricos e pobres saíram lado a lado na busca por gasolina, quando os supermercados viram seus estoques rapidamente caindo e limitaram as vendas a todos sem distinção, quando o CEAGESP – que conta com a maior central de abastecimento de frutas, legumes, verduras, flores, pescados e diversos da América Latina – passa por um grande abalo, quando hospitais, serviços públicos estão à beira do caos e os municípios decretam estado de emergência. Não resta dúvida que o povo exige mudanças já, e não será acusando empresários de liderarem a paralisação dos caminhoneiros, aplicando-lhes as leis que regem o locaute, que se mudará o estado de calamidade em que vivem muitas famílias diariamente. Não é difícil se encontrar entre elas, os filhos sobrevivendo ao se alimentarem da merenda escolar como única refeição, mesmo assim, este pouco e único meio de sobrevivência foi vítima de máfias que roubam o dinheiro da merenda e o escondem debaixo dos colchões dentro de casa. Não será prendendo empresários que se acabará com a vergonha, proporcionada pela corrupção e favorecimentos, onde circulam os milhares de reais escondidos nas cuecas, armazenados em apartamentos ou retirados numa mala do interior de uma pizzaria. Para acabar com a despudorada sanha que denigre a imagem dos brasileiros, isso só se dará promovendo uma limpeza e ela poderia começar com a redenção de quem está no poder, caso contrário o tempo continuará passando e de eleição em eleição, de ato em ato, o Brasil patina. Será promovendo um exame de consciência em nome da própria decadência que se mudará. Será fazendo leis que realmente promovam o bem-estar social sem hipocrisias ou apenas um olhar para o gordo e débil umbigo.

A greve dos caminhoneiros demonstrou claramente que na calamidade estaremos todos juntos no final, onde o mais humilde ainda poderá dar um prato de comida ao seu patrão. União é pensar de uma forma onde todos possam ser beneficiados, cada qual pelo seu esforço e merecimento, cada qual pela sua necessidade humanitária diante da impossibilidade física e mental, cada qual por ser justo ser. O povo quer mudar o Brasil e já não tem palavras que possam traduzir a sua indignação com a classe que está no poder.

No zap circulou uma mensagem nesta sexta-feira que simboliza e resume um desejo, mescla uma boa ideia, que fica entre o verdadeiro e a impossibilidade de realizá-lo, mas não custa nada divulgar aos que não viram ainda, ei-la:

Mensagem que circula pelas redes sociais

“Boa noite, senhor Presidente! Tenho a solução para essa crise com os caminhoneiros: o senhor anuncia zerar todos os impostos sobre os combustíveis e para não ficar com a conta no vermelho devido à isenção de impostos, amanhã mesmo o senhor zera os benefícios para os nossos parlamentos e reduz o salário dos mesmos em 60%. Creio que com essa atitude conseguiria bancar a redução dos impostos nos combustíveis – só lembrando que se os parlamentares entrarem em greve, não se preocupe, será um alívio para o Brasil... (autor não identificado).”

Acrescentaria ao texto do autor desconhecido, também uma redução nos benefícios de outros tantos parasitas que se regalam e se espantam, olhando de cima para baixo o povão que trabalha incessantemente para lhes suprir e pagar com sua labuta, as necessidades medonhas de uns poucos privilegiados que se empenham em manter-se no poder para continuarem transformando esta terra tão bela, gentil e querida, num lugar tão tenebroso para se viver dignamente.

Senadores viajam para a china ao custo que pode ultrapassar 1 milhão de reais. Ilustração: aloart / Sobrefotos: Stock Photo

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