Reportagem especial sobre a Revolução Constitucionalista de 1932

Gerson Soares | publicado em 8 de julho de 2014

Costurando, alimentando e cuidando dos feridos a mulher paulista marcou sua presença na revolução.


Em todo fato grandioso, nos ensina a História, existem os anônimos, aqueles que no momento exato deixam sua marca registrada pela bravura, por fazerem a diferença. Depois da batalha, são condecorados como heróis. Mas existem casos onde nem mesmo é possível lhes prestar uma homenagem. Não em vida.

Homens e mulheres lutaram lado a lado pelo civismo, sendo que elas tomaram para si a responsabilidade e a incumbência de levar aos soldados um pouco mais de conforto. “Mulheres de todas as idades – jovens, crianças, mães, irmãs, filhas, esposas – uniram-se em defesa da soberania de São Paulo”. As paulistas da elite e de todas as classes, estavam irmanadas no descontentamento e quando veio a luta elas incitavam os homens a se alistar, ao mesmo tempo que criavam organizações dando-lhes retaguarda.

Sob a sigla MMDC, Olívia Guedes Penteado, organizou-as para cuidar da assistência à população civil. A médica, educadora e cientista, Dra. Carlota Pereira de Queiroz, organizou o Departamento de Assistência aos Feridos, depois estendida aos familiares dos combatentes. A Liga das Senhoras Católicas, sob a presidência de Olga Meira, “fez um apelo pela Rádio Record e as voluntárias começaram a chegar de toda parte”, atendendo em vários pontos de São Paulo.

 

Lucilla Novaes Prado, aos 91 anos, mostra o capacete da Revolução de 32. Moradora do Tatuapé, tinha orgulho de ter sobrevivido aos combates e atuado em Santos, São Vicente e Praia Grande. Foto: aloimage

 

As paulistas costuravam fardas, gorros, luvas, meias e mantas – o frio era intenso em julho – preparavam compressas para os hospitais. Criaram um organismo de alimentação, distribuindo refeições e mantimentos aos familiares dos soldados, embalando lanches destinados a eles. O número de feridos era grande, muitos homens não sabiam manejar os armamentos, mesmo assim foram para o front. Na Cruz Vermelha Brasileira, que também teve grande atuação, as mulheres frequentavam cursos de enfermagem para lhes prestar cuidados, compensando a falta de profissionais.

A falta de armamentos levou os paulistas à criatividade, “(…) além de armas psicológicas de efeito extraordinário no substituir armas inexistentes. Entre essas ‘armas de mentirinha’, a matraca, que imitava o ‘matraquear’ da metralhadora pesada e o ‘canhão bresseriano’ ou canhão fantasma que não disparava, mas enganava a observação aérea (…)”, descreveu o historiador Hernâni Donato.

 

Duas das medalhas de dona Lucilla, entregues ao jornalista Gerson Soares (fundador do Alô Tatuapé), que também guarda parte de suas memórias deixadas para “um dia serem publicadas”: Medalha da Constituição, onde se lê a frase “Pola Lei, Pola Grei”, do português arcaico: “Pela Lei e Pelo Povo”. Broche-capacete, miniatura do modelo usado pelos soldados constitucionalistas. Arte e Foto: aloimage

 

“Eu costurava até uma certa hora em São Vicente, depois andava até o Forte Itaipú que ficava no outro lado da Ponte Pênsil, indo ajudar na alimentação dos soldados e a cuidar dos feridos”, contou Lucilla Novaes Prado, 91 anos, ex-combatente. “Nosso canhão era um cano enferrujado coberto por uma lona”, lembra brincando e afirma: “Se preciso fosse eu iria outra vez para o front”. O pai de Lucilla também foi ex-combatente. Seu primo e namorado na época, alistou-se e morreu numa instrução de granadas, fato que marcou profundamente sua vida.

Outro acontecimento histórico que lhe deixou marcas pelo resto da vida, foi ter conhecido Santos Dumont, pouco antes de ele cometer o suicídio – que depressivo, viu seu maior invento ser usado para a guerra. “Eu tinha 18 anos e almoçava sempre no Casa Grande Hotel com meu pai, que falava francês, e tive a oportunidade de cumprimentar o Dumont. Ele me perguntou se eu gostava de cachorros, pois ele tinha dois galgos. Os encouraçados São Paulo e Minas Gerais estavam com as proas viradas para o Guarujá e um revolucionário trazia uma bomba em seu avião. Ao avistar os navios, a jogou sobre o Minas Gerais, que respondeu. O avião caiu como uma bola de fogo e Santos Dumont viu isso. Dias depois ele se suicidou, lá mesmo no hotel. Uma coisa muito triste foi passar pelo quarto dele que estava lacrado”, relatou Lucilla a este jornalista.

 

O govenador Pedro de Toledo aparece numa das janelas, ao lado dos chefes da Revolução e o povo aplaude delirantemente. Foto: Álbum de Família / Reprodução: Digesto Econômico

 

Batista Pereira, genro de Ruy Barbosa, traduz de maneira precisa o que foram as mulheres paulistas: “A mulher paulista, que assombro a mulher paulista! A mulher paulista entrou em cena! Todas as classes e todas as profissões comungaram o mesmo fervor de sacrifício e dedicação, desde a operária modesta ao grupo de estrelas da moda, desde a serviçal doméstica às princesas de salão. Epidermes que nunca haviam conhecido o calor de um fogão improvisaram-se em rancheiras dos batalhões e sofriam por longas horas, sem murmurar, o martírio da lenha verde molhada, cuja fumaça lhes arrancava lágrimas dos olhos. Melindrosas assustadiças, cheias de não-me-toques e dengues (dengos), capazes de desmaiar ao contato de uma barata ou à vista de um camundongo, alinhavam por oito dias um curso de enfermagem para correr aos hospitais de sangue, e ali, por vezes debaixo de bombardeios, ajudar nas mais terríveis operações. Mãos que só de nome conheciam a existência da agulha e do dedal começaram a não conhecer outra coisa na vida, curvadas dia e noite sobre a roupa dos soldados. Todas trabalham, todas cooperam, todas inventam, todas organizam. Graças a essa atividade de abelha, nada falta e tudo sobra. Dobram as rações, cada soldado recebe, além da ração cotidiana, uma lata com outra, que além de sobressalente é excelente. Faz frio nas montanhas e nas trincheiras: aparecem às centenas os agasalhos e as mantas de lã feitas em crochê. É preciso assistir as mulheres e os filhos dos combatentes: surgem de um momento para o outro, instituições que os põem ao abrigo das necessidades e do desconforto. Há uma verdadeira emulação de fazer mais, contribuir mais, de sacrificar-se mais pela terra querida. Somem todos os interesses superficiais da vida e toda São Paulo rutila, no esplendor de um heroísmo sobre-humano”.

A Revolução Constitucionalista marcou a vida de muitas mulheres, como mostram os depoimentos da época e os relatos de quem sobreviveu. Foram pouco mais de 53 mil homens, na maior mobilização militar da história brasileira no século XX, contra o poderio do Exército, Marinha e Aeronáutica das forças armadas. Nesse número estão incluídos 200 mil voluntários alistados e muitas mulheres que empunharam os fuzis ao lado dos homens. Um número ainda maior trabalhou na retaguarda, como foi descrito. Graças às atividades das mulheres nada faltou e tudo sobrou, principalmente amor à Pátria.

 

Cartaz convocando as mulheres paulistas para a revolução de 1932. Foto: Wikipedia

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