Dra. Inês Chambel — Nutrição Clínica do Hospital Lusíadas – Amadora, Portugal


O termo “Comer em Família” vai muito além do simples ato de partilhar uma refeição. Trata-se de um momento privilegiado de comunicação e convivência num ambiente descontraído, onde todos os elementos da família podem partilhar ideias, experiências e falar abertamente sobre o seu dia a dia.


Para além de fortalecer os laços afetivos, as refeições em conjunto assumem um papel pedagógico fundamental — especialmente para as crianças. Ao observarem e participarem ativamente nestes momentos, os mais novos aprendem de forma natural sobre a alimentação e adquirem hábitos alimentares que, muitas vezes, os acompanham ao longo da vida.

A alimentação saudável começa em casa

As crianças aprendem, sobretudo, por observação e imitação, o que faz da infância uma fase determinante na aquisição de hábitos alimentares saudáveis. Trata-se, portanto, de um período crucial para incentivar uma alimentação equilibrada e promover comportamentos que tendem a perdurar. Neste contexto, o ambiente alimentar familiar assume um papel central, sendo considerado o fator de maior influência nesta fase do desenvolvimento.

A evidência científica reforça esta ligação: estudos indicam que crianças que realizam cinco ou mais refeições em família por semana apresentam um risco 25% mais reduzido de desenvolver problemas de saúde a nível nutricional, comparativamente àquelas que partilham menos de uma refeição familiar semanal.

Assim, o convívio e a socialização positiva durante as refeições em família têm sido fortemente associados a inúmeros benefícios, tanto a curto como a longo prazo, nomeadamente:

:: Melhores hábitos e escolhas alimentares, com maior consumo de frutas, hortícolas e cereais integrais;
:: Menor ingestão de bebidas açucaradas e consumo de alimentos ultraprocessados;
:: Manutenção de um peso saudável e prevenção do excesso de peso;
:: Prevenção de doenças do comportamento alimentar.

Contudo, importa salientar que a frequência das refeições familiares, por si só, não garante uma alimentação saudável. A qualidade nutricional é um fator igualmente determinante para os resultados observados.

Os principais desafios

A partilha das refeições é um hábito valorizado na maioria das culturas, funcionando como um importante momento de comunhão familiar. Contudo, nos últimos anos, o tempo dedicado às refeições em família tem vindo a diminuir — estes momentos são, cada vez mais, substituídos por comportamentos individualizados, que ocorrem durante a refeição e enquanto partilham o mesmo espaço, protagonizados por atividades como: ver televisão, enviar mensagens, fazer chamadas, consultar as redes sociais, entre outros.

Paralelamente, a qualidade da alimentação das crianças também tem sido alvo de uma preocupação crescente, dada a prevalência elevada de pré-obesidade e obesidade infantil a nível global. Segundo os dados do COSI Portugal 2022 do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, a prevalência de excesso de peso infantil atinge quase um terço das crianças entre os 6 e os 8 anos (31,9%), sendo que 13,5% das crianças nesta faixa etária apresentam mesmo um quadro de obesidade.

Como promover hábitos alimentares saudáveis em família?

As exigências da vida moderna — como a falta de tempo e a dificuldade em planear refeições — representam desafios reais para muitas famílias, comprometendo a frequência e qualidade das refeições. Contudo, é possível adotar estratégias práticas, ajustadas à rotina de cada agregado (família – português brasileiro), que incentivem hábitos alimentares saudáveis:

:: Servir uma variedade de alimentos saudáveis ao longo da semana;
:: Sempre que possível, servir os mesmos alimentos para todos, adaptando apenas as porções;
:: Envolver as crianças na preparação dos alimentos;
:: Comer em família sempre que for possível;
:: Designar um local específico na casa para as refeições familiares;
:: Desligar a televisão e todos os dispositivos digitais pessoais;
:: Incentivar conversas e interações durante as refeições;
:: Permanecer à mesa até que todos os membros da família tenham terminado a refeição;
:: Aproveitar o momento, não apressando a refeição nem a conversa.

A implementação de uma “Mesa de Família” centrada numa alimentação saudável ajustada à rotina de cada agregado é um processo contínuo que requer paciência e adaptações regulares. Embora as estratégias sugeridas sejam um excelente ponto de partida, cada família possui necessidades, horários e dinâmicas próprias, tornando o acompanhamento personalizado essencial.

Na consulta de Nutrição Clínica (em Portugal), as famílias se beneficiam de uma avaliação individualizada, planos alimentares personalizados, estratégias práticas e apoio contínuo.


Destaque – Imagem: aloart / Getty Images


Esta matéria foi produzida com foco no público português, onde está localizada a rede Lusíadas. Porém, as informações de saúde são universais. O leitor poderá encontrar palavras no idioma português de Portugal.


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