A decisão da Promotoria de Justiça Criminal do Tatuapé, proferida pela Promotora de Justiça, Elisa Vodopives, pode ser entendida como uma derrota para a sociedade que espera ser protegida pelas leis vigentes.
Por outro lado, devemos considerar que, em seu julgamento, considere correto acionar sirenes com 120 decibéis durante as madrugadas em São Paulo, uma cidade que trabalha para ser inteligente (leia aqui).
Trata-se de a população ter direito de dormir sem que alguém tenha permissão para acionar sirenes nas portas das suas casas; de autoridades fornecerem credenciais ou permitirem vigilância noturna através de sirenes instaladas em motos.
Diante de tal contrassenso, no que se refere às técnicas de segurança e da mínima razoabilidade, ou seja, a preservação do silêncio noturno para o descanso da população, fomos buscar informações fora do Brasil.
No Reino Unido, Portugal, Noruega, Itália, Estados Unidos ou Canadá, quando conversamos com moradores de cidades desses países sobre existir pessoas acionando sirenes de madrugada para sua segurança e que elas deveriam pagar por isso, foi como uma piada, uma fábula de terror. Muito difícil de explicar.
Como agem os vigias noturnos?
Antes de continuarmos, é importante lembrar resumidamente como agem os vigias noturnos, esta verdadeira exclusividade brasileira. Eles podem pedir aos moradores que coloquem algum tipo de identificação nas fachadas das casas e cobram mensalidades. Para que os contratantes saibam que eles estão “vigiando”, utilizam uma sirene com 120 decibéis de potência, acionando-a de tempos em tempos que variam entre 30, 40 ou 60 minutos. O barulho persiste durante a noite e a madrugada entre 20h30 e 5h.
O som das sirenes acionadas pelos vigias noturnos pode ser ouvido facilmente a até 500 metros de distância. Por isso, é possível imaginar como interagem com a privacidade das pessoas nas pequenas ruas e vielas que percorrem – seus ‘alvos’ favoritos.
Há moradores que lhes pagam por insegurança e medo, outros são coagidos e há os que aderem espontaneamente e nem se preocupam com as pequenas taxas cobradas mensalmente. Esses públicos não acreditam que a polícia e a segurança pública sejam capazes de protegê-los na hora em que precisam, mas imaginam que os vigias estarão lá se precisarem.
O poder paralelo que se instalou nos bairros da capital paulista e nas cidades causa espanto pela tolerância que obtém das autoridades do estado de São Paulo.
Entendemos que, dessa forma, são encorajados a continuar, usurpando a função ostensiva da Polícia Militar ou investigativa da Polícia Civil, durante as madrugadas. Mas há quem diga que são “um complemento”.
Na verdade, os “vigias patrões” se autodenominam “donos da área”, impõem suas próprias regras e o medo nas madrugadas. Quem não paga pode ter um bem danificado ou coisa pior, vive sob tensão; quem reclama sofre perseguições através do barulho na porta de casa. Estes são os fatos.
Quem paga nem sempre está seguro.
No tempo em que estamos trabalhando nestas reportagens, apuramos que somente em uma rua do Tatuapé, três casas foram invadidas e uma loja de comércio foi arrombada. Fiações de casas foram furtadas. Esses fatos aconteceram durante as supostas rondas.
Sem acesso a boletins de ocorrência que são restritos à Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP/SP), não é possível obter mais informações sobre reclamações contra os vigias noturnos motorizados.
Fato, porém, é que fonte policial nos informou que não foi apenas a vítima deste processo que estamos analisando a reclamar, outros moradores do Tatuapé, Vila Gomes Cardim e imediações também reclamam da barulheira diária provocada pelos vigias noturnos motorizados.
Os crimes contra o meio ambiente e a poluição sonora desses vigias são de conhecimento público e das autoridades. Mas isso não os impediu de serem absolvidos, como no processo ao qual tivemos acesso, contrariando a lógica. Dessa forma, até certo ponto, provoca a queda das expectativas de confiança da sociedade na justiça.
Destaque – Imagem: aloart / G I