No dia 5 de novembro de 2015, uma tragédia socioambiental estava acontecendo. Um mar de lama com odores insuportáveis se deslocou por horas pelos cursos de três rios, arrastando tudo pela frente até chegar ao Oceano Atlântico, no litoral do Espírito Santo. Há 10 anos, a Samarco causou mudanças radicais na vida de milhares de pessoas que ainda tentam se recuperar; para muitas, a vida nunca mais será a mesma.
O documentário “10 anos do rompimento da barragem do Fundão”, produzido pelo MPJ Mais pelo Jornalismo em conjunto com a Agência Primaz, traz um levantamento detalhado com depoimentos de quem viveu momentos de angústias e sofrimentos, perdas de entes queridos, de bens e da identidade, do seu habitat e conheceu os custos físicos e emocionais da dispersão.
A tragédia de Mariana foi resultado de uma combinação de falhas técnicas e de gestão, que podem ser caracterizadas como incompetência, negligência e descaso por parte das empresas responsáveis e do poder público. O rompimento da barragem de Fundão ocorreu enquanto ela passava por um processo de alteamento. Essa elevação da estrutura, somada a outras causas, como o acúmulo de rejeitos, levou ao colapso em novembro de 2015.
No final da reportagem são apresentadas diversas respostas da Samarco, empresa causadora da tragédia em Mariana, Minas Gerais.
10 anos do rompimento da Barragem de Fundão
Reportagem de Joyce Campolina, Larissa Antunes e Lui Pereira
Há exatamente uma década, a Barragem de Fundão, de propriedade da Samarco, localizada em Mariana, se rompeu e despejou cerca de 40 milhões de metros cúbicos de rejeito que percorreu cerca de 660 km pela bacia do Rio Doce até chegar no Oceano Atlântico. 10 anos após o maior desastre-crime socioambiental da história do Brasil, nós fomos ouvir as histórias de alguns atingidos das cidades de Mariana e Barra Longa. Seus relatos serviram de base para a criação desta reportagem especial.
O dia que a vida parou
Há dez anos, em 5 de novembro de 2015, a rotina dos distritos de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, em Mariana, o distrito de Gesteira e a cidade de Barra Longa, foi interrompida pelo rompimento da Barragem de Fundão. Esse evento trágico resultou em 19 mortes, incluindo trabalhadores da mineração e membros da comunidade de Bento Rodrigues, o primeiro local atingido, cerca de 20 minutos após o incidente. O rejeito percorreu os cursos do Rio Gualaxo do Norte, do Rio do Carmo e toda a extensão do Rio Doce até o Oceano Atlântico, onde chegou 17 dias depois.
O desastre destruiu comunidades inteiras, soterrou aproximadamente 100 km de matas ciliares e deixou centenas de milhares de pessoas sem acesso à água potável. Além disso, causou prejuízos significativos nos setores pesqueiro, agropecuário e turístico. A tragédia alterou profundamente a relação entre comunidades ribeirinhas e tradicionais, incluindo indígenas e quilombolas, com o rio. De forma permanente, também modificou a discussão sobre os riscos inerentes ao modelo de mineração vigente.
Uma década após o ocorrido, nosso objetivo é entender os resultados do processo de reparação até o momento e as perspectivas futuras para essas comunidades.
A lama e o caos
O dia 5 de novembro de 2015 foi quente e ensolarado. Em Bento Rodrigues, a diretora da escola municipal, Eliene Geralda dos Santos, descreve o dia como “comum, né? Tudo ia bem, tudo dentro normalidade”. Dentro da escola, protegida por muros altos, a diretora não percebeu a tragédia que se desenrolava na rua. “A gente não ia conseguir perceber nada se meu marido não tivesse ido lá na porta da escola avisar a gente”, pontua.
Quando o aviso veio, a reação foi caótica em uma corrida desesperada pela vida, pois o tempo se esgotava.
Todo mundo saiu correndo, não tem esse negócio igual a mídia colocou muito, todo mundo foi bonitinho, juntinho com os professores, não. Cada um correu para onde achava que tinha que correr. Eu mal consegui salvar nem a mim mesma, como eu vou conseguir salvar alguém numa hora dessas? Nessas horas é cada um por si mesmo.
Eliene Geralda dos Santos, diretora da Escola Municipal de Bento Rodrigues.
Pablo Henrique Fialho dos Santos, que hoje trabalha como comerciante no Novo Bento Rodrigues, tinha apenas 15 anos e estava na escola quando a lama chegou: “Tinha um ônibus lá fora, a gente conseguiu colocar os mais velhos dentro e em coisa de 5 minutos, acabou o Bento todo. Rápido, muito rápido”, comentou.
A comerciante Darlisa das Graças Eusébio Azevedo, proprietária do Bar da Una, estava dentro de casa, descansando, quando o pânico se instaurou. “Eu escutei, sabe, umas gritaria, choradeira no meio da rua afora. Eu tive aquela curiosidade, né? Fui abrir a janela de casa para ver o que estava acontecendo. Aí a menina foi e gritou comigo: ‘Sai de casa que a barragem estourou’, foi só a conta de eu abrir a porta e sair. Nem chinelo não deu tempo de eu pegar”. Já Rosa Maurília, hoje com 94 anos, relembra o “barulhão” e o sofrimento de “ter que correr demais” para fugir da lama.
Quatro horas depois, já era noite quando a lama atingiu Paracatu de Baixo. Waldir Pollack, produtor rural, recorda a forma brusca como foi alertado para deixar sua casa: “Disseram: ‘Você tem cinco minutos para sair daí. Senão, vão embora junto com a lama. Roupa a gente compra outra, agora vida não tem jeito’. Então entramos na caminhonete, pegamos apenas o dinheiro e os documentos”, relata.
A professora Angélica Peixoto conta que, apesar da comunidade estar alerta aos avisos da Defesa Civil, o momento em que a lama chegou foi aterrorizante. “Era impossível ver qualquer coisa; só deu para ouvir o barulho, que era horrível”, descreve.
A lama trazia consigo uma sensação de destruição total. “E, também um fedor muito forte, um odor, sabe? Muito… Sei lá, uma coisa que entrava pelo nariz que incomodava muito… Eu fiquei com a sensação que seria um cheiro de enxofre… É uma mistura assim de um cheiro ácido mesmo”, lembra.
A reportagem completa pode ser lida na página do Especial — 10 anos do rompimento da Barragem de Fundão
Destaque – “10 anos do rompimento da Barragem de Fundão”. Foto: Larissa Antunes/Agência Primaz





