Nos idos de 1930, o mundo atravessou um período que entrou para a História como “A Grande Depressão”. Em 1929, a quebra da bolsa de Nova York deu origem à maior crise do capitalismo financeiro de que se tem notícia. Os efeitos foram desastrosos. Famílias perderam praticamente tudo, trabalhadores ficaram desempregados, uma pobreza avassaladora avançou sobre o planeta. Muitos não conseguiram lidar com as perdas e tiraram a própria vida.

Por Antonio Carlos Lopes


Esse título, “Grande Depressão”, não poderia ser mais adequado para apontar o que no Brasil dos últimos anos vem sendo observado: saúde financeira e saúde mental andam lado a lado. A tribulação econômica enfrentada no país desde a última década impactou severamente nossas perspectivas.

Em maio de 2015, no ápice da crise, pesquisa Ibope apontava que 47% dos brasileiros eram pessimistas diante do futuro. De lá para cá, a tímida melhora nos indicadores econômicos promoveu também um leve aumento na esperança do nosso povo, esbarrando, entretanto, no período pandêmico da Covid-19.

A prevalência dos sintomas de depressão associada à instabilidade financeira nos assombra. O implacável medo de não conseguir pagar as contas, prover uma casa e garantir o básico tem sido uma constante no tempo presente.

Brad Klontz, psicólogo e professor da Universidade de Nebraska (EUA), é um dos estudiosos que apontam como o colapso de 29 fabricou uma geração traumatizada, sempre pensando que não teria o suficiente para o amanhã. Efeito semelhante foi constatado na geração americana que sofreu o impacto da crise de 2008 e da pandemia de 2020.

A depressão é sua faceta mais conhecida, mas a ansiedade, o estresse, o esgotamento emocional e até as crises de pânico são outros sintomas desencadeados pela falta de dinheiro para sobreviver com dignidade. Além da dificuldade com questões de rotina, qualquer emergência surgida na escassez implica em dificuldades extremas. O diagnóstico de uma doença, por exemplo, pode ganhar contornos absurdos sem uma reserva financeira. Até atividades de lazer se esgotam, uma vez que as restrições impostas diminuem as possibilidades.

Tudo isso indica um problema ainda mais agudo: os impedimentos que a falta de dinheiro traz sequer podem ser tratados corretamente. Com a carteira esvaziada, é mais difícil comprar medicamentos ou ser acompanhado por um profissional qualificado. Nosso sistema público de saúde não consegue, infelizmente, dar soluções justas a tais situações.

Um olhar adequado sobre a saúde mental no Brasil de 2023 certamente não pode desprezar os pontos aqui elencados. Mesmo aqueles que conseguem acessar um tratamento mínimo não têm seus problemas solucionados apenas pela Medicina. Sem emprego, teto e comida na mesa, nem bons profissionais da saúde podem nos salvar.


Antonio Carlos Lopes, presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica


Destaque – Imagem: aloart | A.C.Lopes / SBCM / Divulgação


Publicação:
Sábado | 30 de setembro, 2023