Domingo | 14 de abril, 2019 | 13h34
Uma das condições que permitiram o surgimento e a manutenção da vida na Terra é o fato de o planeta ser geologicamente ativo, com terremotos e vulcões.
Elton Alisson | Agência FAPESP
A atividade vulcânica, gerada pela movimentação das placas tectônicas sobre o manto terrestre (tectonismo) possibilita reciclar gases, como o dióxido de carbono, através do manto, da crosta, da atmosfera e dos oceanos. Dessa forma, contribui para tornar a Terra habitável ao manter a temperatura do planeta em condições ideais para a sobrevivência dos seres vivos, explicam os cientistas.
Um estudo feito por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) sugere a existência de outros planetas rochosos na galáxia em que se encontra a Terra – a Via Láctea – com altas probabilidades de apresentarem tectonismo, o que aumenta a chance de também serem habitáveis.
Os resultados do trabalho, apoiado pela FAPESP, foram publicados no Monthly Notices of Royal Astronomical Society (MNRAS). O estudo tem a participação de pesquisadores do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP) e de outras universidades e instituições de pesquisa no Brasil e no exterior.
“Verificamos que há condições geológicas favoráveis para o surgimento e a manutenção da vida em exoplanetas rochosos, e que ela [a vida] pode estar espalhada por todo o disco da galáxia e ter se originado em qualquer época da evolução da Via Láctea”, disse Jorge Luis Melendez Moreno, professor do IAG-USP e um dos autores do estudo, à Agência FAPESP.
Os pesquisadores determinaram os parâmetros superficiais, as massas e as idades de 53 gêmeas solares, situadas em diferentes pontos da Via Láctea. Além disso, analisaram a composição química dessas estrelas gêmeas solares – chamadas assim por terem temperatura, gravidade e composição química superficiais parecidas com as do Sol –, a fim de avaliar a possibilidade de existência de outros planetas rochosos em torno delas.
As análises foram feitas por meio de um espectrógrafo chamado HARPS, instalado no telescópio de 3,6 metros do Observatório de La Silla, do European Southern Observatory (ESO), no Chile. O equipamento registra o espectro eletromagnético de “cores” dos corpos celestes, dos comprimentos de onda mais curtos (ultravioleta) aos mais longos (infravermelho).
As análises indicaram que as estrelas apresentam grande abundância de tório – elemento radioativo com isótopos instáveis que, ao se romper, em razão da instabilidade atômica, se divide em isótopos menores que emitem energia, processo conhecido como decaimento radioativo.
A energia liberada pelo decaimento de isótopos instáveis, tanto de tório como de outros elementos radioativos, como urânio e potássio, dá origem à movimentação de magma (convecção do manto) e à atividade tectônica da Terra. Parte do calor interno do planeta é resquício do calor primordial da formação da Terra, mas pelo menos a metade da energia é devida ao decaimento radioativo.
Dessa forma, as concentrações iniciais desses elementos radioativos em um planeta rochoso contribuem de modo indireto para a habitabilidade em sua superfície, especialmente devido ao longo tempo de decaimento, em escalas de bilhões de anos, explicam os pesquisadores
“As concentrações de tório nas estrelas gêmeas indicam que há uma grande quantidade de energia disponível pelo decaimento desse elemento radioativo para manter a convecção do manto e o tectonismo em potenciais planetas rochosos que possam existir em torno de gêmeas solares”, afirmou Rafael Botelho, doutorando em Astrofísica no Inpe e primeiro autor do estudo.
A abundância inicial de tório nas gêmeas solares foi comparada com as de ferro, silício – um indicador da espessura e massa do manto convectivo em planetas rochosos – e mais dois elementos pesados: o neodímio e o európio. As medidas indicaram que a razão tório-silício em gêmeas do Sol aumenta com o tempo, e que foi maior ou, no mínimo, igual ao valor solar desde a formação do disco da galáxia da Terra.
“Há indícios de que o tório também é abundante em gêmeas solares velhas. Isso significa que o disco da Via Láctea pode estar repleto de vida”, disse André Milone, pesquisador do Inpe e orientador da pesquisa de Botelho.
O artigo Thorium in solar twins: implications for habitability in rocky planets, de R. B. Botelho, A. de C. Milone, J. Melendez, M. Bedell, L. Spina, M. Asplund, L. dos Santos, J. L. Bean, I. Ramirez, D. Yong, S. Dreizler, A. Alves-Brito e J. Yana Galarza, pode ser lido em academic.oup.com/mnras/article-abstract/482/2/1690/5134163?redirectedFrom=fulltext.
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