Técnica anestésica reduz a incidência de dor crônica e depressão após cirurgia para retirada da mama. Conforme o estudo, publicado na revista Scientific Reports, “o câncer de mama é o segundo tipo de câncer mais comum diagnosticado em mulheres. A dor neuropática crônica após a mastectomia ocorre com frequência e é um sério problema de saúde”, divulgaram os autores. Leia a seguir a matéria.

Por André Julião | Agência FAPESP


Estudo feito no Hospital Sírio-Libanês comprovou a eficácia de associar o bloqueio de nervos da região mamária à anestesia geral durante a mastectomia. Estratégia, já disponível no SUS, reduziu a ocorrência de dores no local da cirurgia e em outras partes do corpo em mulheres acompanhadas durante um ano.

Após passar pelo diagnóstico de câncer, a mastectomia, radioterapia, quimioterapia e hormonioterapia, a mulher que teve tumor na mama pode conviver com dores crônicas, aquelas que persistem por mais de três meses, decorrentes da cirurgia. E esse quadro, que afeta entre 30% e 70% das pacientes, não raramente leva a sintomas de depressão.

Pesquisa

Um grupo de pesquisadores do Hospital Sírio-Libanês conseguiu reduzir esses desdobramentos negativos graças a uma estratégia: associar, durante a cirurgia, a anestesia geral ao bloqueio dos nervos da região da mama. Os medicamentos bloqueiam a condução do estímulo doloroso pelos nervos, proporcionando um efeito duradouro, como mostra estudo publicado na revista Scientific Reports.

Com o procedimento, foram reduzidas tanto a incidência de dor crônica no local da cirurgia como dores em outras partes do corpo, além de sintomas depressivos, mesmo um ano após a cirurgia. Além do uso do bloqueio ter se tornado a prática padrão no Hospital Sírio-Libanês, onde o estudo foi conduzido, o procedimento já está disponível no Sistema Único de Saúde (SUS).

“Para isso, é preciso apenas que o hospital tenha um aparelho de ultrassom, usado para localizar o plano onde os nervos intercostais passam, para administração dos anestésicos locais, e um anestesiologista capacitado para isso”, conta Raquel Martinez, pesquisadora do Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio-Libanês e da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP), que coordenou o estudo.

 

No procedimento, o aparelho de ultrassom (à esq.) localiza a região a ser bloqueada (à dir.) e, a seguir, o anestésico local é injetado com uma agulha, bloqueando a área e impedindo a sinalização da dor. Imagens: Márcio Matsumoto

 

Menos dor e depressão

A pesquisa é a continuação de um trabalho publicado pelo grupo em 2018. Na ocasião, 49 mulheres com câncer de mama foram submetidas à mastectomia total. Vinte e quatro receberam apenas anestesia geral.

Nas outras 25, foi adicionado à anestesia geral o bloqueio dos nervos intercostais utilizando-se anestésico local, aplicado depois de localizar as regiões específicas por meio de ultrassom.

Um ano depois do procedimento, os sintomas de depressão eram muito menores nas pacientes que receberam o bloqueio associado à anestesia geral, ocorrendo em menos de 20% das pacientes. Em contrapartida, mais de 50% das mulheres do grupo que recebeu apenas a anestesia geral apresentaram sintomas depressivos.

“A dor gera o que chamamos de comportamento doloroso, criando ansiedade e sintomas depressivos. A paciente com menos dor tem mais qualidade de vida e, consequentemente, menos depressão”, conclui Martinez.

Benefícios a outros setores

No Hospital Sírio-Libanês, o protocolo de bloqueio se estendeu para outros setores. No pronto-socorro, por exemplo, pacientes que chegam com fraturas do fêmur recebem um bloqueio de nervos periféricos antes mesmo da cirurgia, a fim de aliviar a dor e evitar prejuízos futuros.

O estudo completo está disponível em One year follow-up on a randomized study investigating serratus anterior muscle and pectoral nerves type I block to reduced neuropathic pain descriptors after mastectomy.


Destaque – Imagem: aloart


Publicação:
Domingo | 10 de dezembro, 2023