Domingo, 26 de novembro de 2017 às 12h21

 

Dentre tantas atrocidades cometidas em nome da falta de responsabilidade e patriotismo que permeia o Congresso Nacional, temos um quadro que há muito tenta se tornar permanente, a exploração ilegal da Amazônia brasileira, sob diversos aspectos, buscando através da corrupção os meios “legais” para legalizar o crime.

Gerson Soares

Aqui uma amostra dessa tragédia orquestrada por interesses que nada tem com a elevação dos povos da floresta. Uma insensatez que só pode ser explicada pela ganância, motivo maior do sofrimento imposto aos rincões desse imenso país sem lei. Ao passar os olhos pelo relatório elaborado pelo Greenpeace é possível que o leitor fique sensibilizado; ao lê-lo, estarrecido. Leia a matéria que segue e baixe o relatório.


Do Greenpeace Brasil

MADEIRA MANCHADA DE SANGUE

Acusado de ser o mandante do massacre de Colniza, Valdelir João de Souza segue foragido da justiça, o que não o impede de negociar madeira amazônica.

No fim de semana do dia 19 de abril de 2017, quatro homens armados com facas, facões, revólveres e espingardas entraram em um ramal do Distrito de Taquaruçu do Norte, zona rural de Colniza, no Mato Grosso, com o objetivo de matar e aterrorizar a população local. O grupo de extermínio, conhecido como “Os Encapuzados”, percorreu cerca de dez quilômetros promovendo execuções e tortura. Ao todo, nove pessoas foram mortas.

 

Para homenagear as vítimas da violência no campo na Amazônia, o Greenpeace colocou 251 cruzes em frente ao Congresso Nacional – número de pessoas assassinadas no bioma entre 2007 e 2016 – para sinalizar que a violência contra a floresta e seus povos começa exatamente em Brasília. Foto: © Lucas Sobral / Greenpeace

 

Segundo denúncia do Ministério Público do Estado do Mato Grosso (MPE-MT), o ataque, que ficou conhecido como “massacre de Colniza”, foi motivado pela cobiça de madeireiros e grileiros pelos recursos existentes na região de Taquaruçú do Norte, distrito do município de Colniza.

Apontado pelo MPE-MT como o mandante do crime, Valdelir João de Souza, conhecido como “Polaco Marceneiro”, é proprietário das empresas Madeireira Cedroarana e G.A. Madeiras, responsável pelo Plano de Manejo Florestal localizado ao lado do local da chacina. A motivação do crime estaria na existência de espécies valiosas, como o ipê, jatobá e massaranduba, amplamente utilizados para construção de decks e móveis de alto valor comercial, na área de floresta em que viviam os agricultores assassinados.

Souza está foragido, mas suas madeireiras continuam funcionando normalmente, processando madeira que depois é vendida no mercado nacional e internacional. Uma investigação do Greenpeace publicada no relatório “Madeira manchada de sangue” mostrou que, de maio a agosto de 2017, a madeireira Cedroarana enviou sete remessas de madeira para os Estados Unidos. No dia em que ocorreu a chacina em Colniza, essa mesma empresa embarcou cargas de madeira para os Estados Unidos e Europa. Em 2016 e 2017, exportou milhares de metros cúbicos de madeira amazônica para países como os Estados Unidos, Alemanha, França, Holanda e Portugal.

 

Em protesto, ativistas do Greenpeace instalaram um banner na madeireira Pampa, próxima de Belém (PA), em 2014, com o recado “lavado para exportação”. Foto: © Marizilda Cruppe/Greenpeace

 

Graças a facilidade de fraudar os sistemas de licenciamento e controle de madeira no Brasil, cenas como as do “massacre de Colniza” estão se tornando cada vez mais comuns, especialmente na Amazônia, onde os conflitos no campo são frequentemente ligados à madeira ilegal. A pressão exercida pela indústria madeireira e pela grilagem de terras vem ameaçando as florestas da região e colocando populações rurais e tradicionais sob ameaça. São inúmeros relatos de execuções com requintes de crueldade, tentativas de assassinato e intimidação, o que gera um clima de tensão e medo na vida das pessoas que defendem a floresta.

Como afirma a extrativista Giselda Pereira Ramos Pilker, moradora da Resex Massaranduba, que fica em Rondônia, região que sofre com a violência promovida pela madeira ilegal, as ameaças constantes acabam mudando a rotina de todos que dependem da floresta: “Eu tenho orgulho de cuidar disso tudo. Tenho certeza de que não é meu, que pertence a um bem muito maior, de bilhões de pessoas. E vou lutar com todas as minhas forças até alguém me escutar”, diz.

Madeira ilegal e violência

Estados como Pará, Mato Grosso e Rondônia são responsáveis por mais de 85% da produção de madeira serrada na Amazônia. Se existisse um plano nacional de apoio ao manejo comunitário, a exploração madeireira poderia servir como fonte de renda para as populações da floresta e um meio de mantê-las na terra, em segurança, protegendo a floresta. Mas não é o que acontece. Estudos apontam que parte da madeira que entra no mercado foi explorada de áreas onde a extração não é permitida, como Unidades de Conservação de proteção integral , Territórios indígenas e áreas de manejo extrativista. Quando populações tradicionais e indígenas oferecem oposição ao roubo de madeira, acabam colocando-se na mira da violência, entre a floresta e os criminosos.

 

O mapa mostra a relação entre assassinatos no campo nos últimos dez anos e o Arco do Desmatamento. Arte: Greenpeace

 

“A impunidade para este tipo de crime e a falta de seriedade do Estado em combater a ação de madeireiros ilegais criam um ambiente propício para que a ilegalidade prospere”, afirma Rômulo Batista, da campanha Amazônia do Greenpeace. “Diante desse cenário, fica impossível confiar na procedência da madeira brasileira, pois a cadeia está toda contaminada”, completa.

O relatório “Madeira Manchada de Sangue” faz parte da campanha Chega de Madeira Ilegal do Greenpeace, que desde 2014 investiga, denuncia e expõe casos de fraudes em nos sistemas de licenciamento e controle de madeira do Brasil. “Infelizmente, o Brasil ainda não avançou. Não temos sistemas integrados de licenciamento e controle da cadeia produtiva de madeira e planos de manejo com indícios de irregularidades continuam ativos. Até que consigamos como sociedade mudar isso, os povos que estão na linha de frente pela proteção das florestas continuarão a sofrer as consequências diretas e o restante do mundo as indiretas”, diz Batista.

Ativistas do Greenpeace protestaram na madeireira Pampa Exportações Ltda, próximo a Belém (PA), contra a exploração ilegal e predatória de madeira na Amazônia (©Paulo Pereira/Greenpeace)

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