Sábado | 18 de junho, 2022


O Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu dias atrás, em julgamento definitivo, o entendimento legal sobre a cobertura do rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) por parte dos planos de saúde.

Por Antonio Carlos Lopes
Presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica


Até então, os pacientes tinham direito legal a assistência ampla, inclusive a técnicas e cirurgias por vezes fora da lista, mas indispensáveis ao tratamento adequado. Agora, após o parecer do STJ, o quadro é outro: o que não constar do rol não precisará mais ser coberto pelas operadoras da cadeia suplementar.

Faço parêntese para tornar mais claro os termos que têm sido usados em reportagens sobre o tema para facilitar a compreensão sobre o ocorrido: a lista da ANS era apenas um exemplo (ou exemplificativa) e os pacientes tinham acesso a outros procedimentos. Porém, com o novo entendimento do STJ, transformou-se em taxativa, quer dizer, não estando no rol, não há cobertura. Ou, quase por milagre, em raríssimas exceções.

Assim, na prática, as empresas ficam desobrigadas a atender a uma série de tratamentos e medicamentos aprovados recentemente, a certos tipos de quimioterapia oral, de radioterapia e até a cirurgias com técnicas de robótica.

A consequência é óbvia, basta olhar o comportamento histórico de distintas corporações da rede suplementar. Em 2021, os planos de saúde lideraram o ranking de reclamações, segundo números do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). Foram responsáveis por quase um quarto das queixas (24,9%) registradas.

Falamos, portanto, de um retrocesso evidente do setor de saúde complementar. São cerca de 50 milhões de brasileiros atingidos. De hora para outra, eles se veem sem direitos essenciais que até então eram resguardados pela Lei 9656/1988.

O efeito tende a ser desastroso, aprofundando a assimetria de poder entre operadoras e pacientes, deixando-os ainda mais desprotegidos e vulneráveis nos momentos de maior necessidade em saúde. Lembrando, aliás, que a pandemia já piorara demais a situação dos usuários que já sofriam com a falta de equilíbrio e os altíssimos reajustes de mensalidades.

Para piorar, em 26 de maio, a ANS autorizou reajuste de 15,5% dos planos individuais e familiares para o período de maio de 2022 até abril de 2023: o maior aumento desde o início da série histórica, em 2000.

Não à toa, pesquisa da Associação Paulista de Medicina (APM), com 3.043 médicos de todo o Brasil, revela que 88,3% dos médicos já presenciaram pacientes abandonarem tratamentos por conta de reajustes das mensalidades no campo suplementar.

Por fim, registro que há esperança no fim do túnel. Talvez a decisão seja revertida, pois uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), em tramitação no Supremo Tribunal Federal, pode mudar o entendimento do STJ.

Que assim seja.