Pelo menos nas áreas investigadas pela nossa reportagem na capital paulista, ao tentar registrar boletins de ocorrência presenciais, contra a barulheira provoca pelos vigias noturnos e suas sirenes, as pessoas são tratadas com desdém.


Pelo menos um processo entregue diretamente ao Ministério Público de São Paulo (MPSP) não prosseguiu. Na Assembleia Legislativa, deputados que apresentaram propostas proibindo o uso de sirenes pelos vigias noturnos, seus projetos de lei foram engavetados.

Afinal, por que não são fiscalizados e o assunto é tabu?

Toda essa polêmica envolve o Ministério Público de São Paulo, a Polícia Civil e a Polícia Militar. E, mais ainda, a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP/SP), que emite as credenciais desses vigias e não fiscaliza sua atividade. E, se fiscaliza, continua permitindo, pelo menos há 10 anos, as inúmeras infrações às leis vigentes que deveria proteger. Por mais explicações que peçamos, as respostas entregues pela SSP/SP são sempre evasivas ou repetitivas, inconclusivas.

Deputados da Assembleia Legislativa de São Paulo (ALESP) nunca conseguiram proibir a atividade. O mesmo acontece com programas parecidos na Câmara Municipal. A Promotoria do Meio Ambiente do MPSP lançou o livreto “Ruído e Nossa Saúde”, que faz diversas observações sobre a poluição sonora, parece ter ignorado as sirenes dos guardas noturnos.

Afinal, por que essa atividade não é fiscalizada? Por que não são punidos? Por que estão acima das leis? As madrugadas não fazem parte da segurança de São Paulo? Por que simplesmente não se proíbe esse ato, já que é amplamente conhecido das principais autoridades judiciárias e legislativas?

Essas questões não são respondidas pelos órgãos que deveriam dar respostas à sociedade. O processo que estudamos, porém, demonstra claramente que não existe a menor vontade de punir os vigias noturnos em detrimento das pessoas que padecem com seus atos.

Toda essa impunidade e proteção a esses agentes poluidores nos leva a crer em possibilidades bizarras. Chama a atenção seu domínio completo das madrugadas. Os vigias noturnos conhecem os hábitos do comércio, das empresas e das pessoas. Eles são desconhecidos da maioria que não paga por esse tipo de ‘segurança’, mas podem conhecer a todos.

Coação e medo no Tatuapé.

Indo mais longe, o 30º Distro Policial (DP) do Tatuapé, órgão da SSP/SP, permitiu, apesar das nossas insistentes tentativas de mostrar a irregularidade, que esses vigias coagissem – inclusive durante a tramitação do processo –, induzissem a erro ou amedrontassem as pessoas. Suas placas de publicidade, fixadas nas fachadas das casas, continham a seguinte frase: “Contato com o 30º DP”, levando a crer que fossem imbuídos de alguma autoridade ou fizessem parte daquela delegacia.

Em uma das reclamações, a vítima foi desrespeitada ao se dirigir ao 30º DP e, em outra, a escrivã gritou quando a vítima disse não entender algo que perguntava. Esse foi o tratamento que recebeu até desistir de se dirigir a esse DP.

Ao contrário, a tolerância com os vigias durante o inquérito pareceu ter sido bem diferente. Apesar de alegarem estar com suas credenciais vencidas há anos, não saberem declarar o próprio CNPJ da empresa que constituíram, continuaram acionando suas sirenes impunes, logo após saírem da delegacia com os documentos vencidos.

Programa Vizinhança Solidária.

Essa atividade, a de vigias noturnos acionadores de sirene, se espalha por diversos bairros da capital paulista e está em outras cidades. As pessoas com quem conversamos acreditam que isso ocorreu graças ao afastamento da Polícia Militar (PM) das rondas noturnas.

Tentamos contato com o 8º BPM/M para saber se isso é verdadeiro na região de atuação dos vigias noturnos processados, subscrita ao 30º DP, mas não recebemos resposta.

Existe uma política de que o cidadão deve participar da sua própria segurança, e pode fazê-lo através do Programa Vizinhança Solidária (PVS) da PM (saiba mais aqui); caso contrário, deve ligar para o 190.

Entretanto, atualmente, a maioria das ruas antes atendidas pelos vigias noturnos aos quais nos referimos aderiu ao PVS na área circunscrita ao 8º BPM/M. Obviamente, essa mudança de atitude teve a ineficácia desse ato nocivo de acionar sirenes inocuamente, como motivo. Ato este que, do ponto de vista da segurança, é totalmente improdutivo. Mas, que, no entanto, pode causar males irremediáveis à saúde, como demonstraremos.


Leia todas as reportagens e tópicos, assista aos vídeos, desta 3ª série especial que mostra como as autoridades supostamente não fazem cumprir a legislação no caso dos vigias noturnos motorizados.


Destaque – Imagem: aloart G I

 


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